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domingo, 14 de abril de 2019

[TRADUÇÃO] Interpretação do Genesis: um histórico pré-Darwin


Traduzido de BioLogos por David Sousa


Como o relato da Criação de Gênesis era interpretado antes de Darwin? 


Introdução

Muitas pessoas assumem que a teoria da evolução de Darwin deve ter abalado as fundação da Fé cristã por causa da diferença marcante entre o relato da evolução e a ideia de uma Criação do mundo em seis dias. Na verdade, a interpretação literal em relação aos dias dos capítulos 1 e 2 de Gênesis não foi a única perspectiva adotada por pensadores cristãos antes da publicação de A Origem das Espécies, em 1859. Os trabalhos de muitos teólogos e filósofos cristãos antigos revelam uma interpretação de Gênesis compatível com a visão científica darwiniana.

Pensamento Cristão Antigo


Orígenes, um filósofo e teólogo cristão do terceiro século, de Alexandria, no Egito - um dos grandes centros intelectuais do mundo antigo - serve de exemplo para o pensamento cristão primitivo sobre a Criação.

Mais conhecido por suas obras Sobre Primeiros Princípios e Contra Celso, Orígenes apresentou as principais doutrinas do cristianismo e as defendeu contra acusações pagãs. Orígenes se opôs à ideia de que a história da Criação deveria ser interpretada como um relato literal e histórico de como Deus criou o mundo. Houve outras vozes antes mesmo de Orígenes que advogaram por interpretações mais simbólicas do relato da Criação. E as perspectivas de Orígenes foram influentes também para outros pensadores cristãos primitivos que vieram após ele.[1]

Santo Agostinho de Hipona, um bispo do Norte da África durante o início do século V, foi outra figura central do período. Apesar de ser largamente conhecido por suas Confissões, Agostinho foi autor de dezenas de outras obras, muitas das quais focam nos dois primeiros capítulos de Gênesis.[2] Em O Significado Literal do Gênesis, Agostinho argumenta que os dois primeiros capítulos de Gênesis foram escritos para se ajustar ao conhecimento das pessoas naquela época.[3] A fim de se comunicar de forma que todos pudessem entender, a história da Criação foi contada em um estilo mais simples, alegórico. Agostinho também acreditava que Deus criou o mundo com a capacidade intrínseca de se desenvolver, uma visão que também se harmoniza com a evolução biológica.[4]

Pensamento Cristão Posterior


Houve ainda muitas outras propostas de interpretação literal de Gênesis 1-2 mais tarde na História. São Tomás de Aquino, um filósofo e teólogo bem conhecido do século XIII, estava particularmente interessado na interseção entre Ciência e Religião e foi fortemente influenciado por Agostinho. Tomás não temia as possíveis contradições entre a história da Criação em Gênesis e o conhecimento estabelecido em seu tempo.

Na sua Suma Teológica, ele responde à questão de se todos os seis dias da Criação são na verdade a descrição de um único dia [conforme a leitura de Gênesis 2.4 sugere], uma teoria que o próprio Agostinho sugeriu. Tomás argumenta em favor da visão que Deus criou todas as coisas com potencialidades em si mesmas:
"No dia em que Deus criou os céus e a terra, criou também todos os arbustos do campo, não em ato, mas 'antes de eles surgirem da terra', isto é, em potência. (...) Não foi por impotência de Deus, como se necessitasse de tem­po para operar, que todas as coisas não foram simultaneamente distinguidas e ornamentadas, mas para salvar a ordem na instituição delas." [5]
A perspectiva agostiniana da Criação pode ser vista até no século XVIII - logo antes de Darwin publicar A Origem das Espécies - nos trabalhos de John Wesley. Ministro Anglicano e fundador do movimento Metodista, Wesley, assim como Agostinho, argumentava que as Escrituras foram escritas em termos apreensíveis para a sua audiência original. Ele escreve: 
"O escritor inspirado nesta história [Gênesis] (...) [escreveu] para os hebreus primeiro e, calculando suas narrativas para o estado infante da Igreja, descreve as coisas através de suas aparências sensíveis exteriores, e nos deixa sermos guiados para a compreensão dos mistérios exprimidos dentro do texto por descobertas posteriores da luz divina." [6]
Wesley também argumenta que as Escritura "foram escritas não para satisfazer nossa curiosidade [de detalhes] mas sim para nos conduzir a Deus". [7]

No século XIX, o Seminário Teológico de Princeton era conhecido por sua defesa convicta do calvinismo conservador e pela autoridade absoluta da Escritura. Talvez o teólogo mais notável de Princeton naquela época, B.B. Warfield, aceitava a evolução como fornecendo um relato científico adequado das origens humanas. Ele acreditava que ouvir a voz de Deus na Escritura e os achados dos trabalhos científicos sólidos não estavam em oposição. Como o historiador Mark Nolls escreve, "B. B. Warfield, o defensor moderno mais capaz da doutrina conservadora da inerrância bíblica, era também um evolucionista".[8]

Conclusão

A história do pensamento cristão nunca foi dominada consistentemente por proponentes de uma interpretação literal do Gênesis. As descobertas da ciência moderna não devem ser vistas nem como incentivadores do abandono da confiança na Escritura, nem como contraditórias à Escritura, mas sim como uma espécie de guia em direção a um entendimento adequado do significado das Escrituras.

Agostinho oferece este conselho:
"E se lermos alguns escritos sobre assuntos obscuros e muito ocultos aos nossos olhos, mesmo divinos, que possam, salvando a fé na qual estamos imbuídos, apresentar várias opiniões, não nos lancemos com precipitada firmeza a nenhuma delas, para não cairmos em erro. Talvez uma verdade discutida com mais cuidado venha destruir aquela opinião. Desse modo, não estamos lutando em favor da opinião das divinas Escrituras, mas pela nossa de tal modo que queremos que seja das Escrituras a que é nossa, quando devemos querer que seja nossa aquela que é opinião das Escrituras." [9]
Notas e Referências

[1] Peter C. Bouteneff, Beginnings: Ancient Christian Readings of the Biblical Creation Narratives. Grand Rapids: Baker, 2008.

[2] Santo Agostinho, Confissões. Coleção Patrística, Volume 10, 1ª edição. Paulus, 2005.

[3] Santo Agostinho, Comentário ao Gênesis. Coleção Patrística, Volume 21, 1ª edição. Paulus, 2005.

[4] Para uma discussão mais profunda sobre a perspectiva agostiniana da criação, veja o capítulo 6 de A Linguagem de Deus, de Francis Collins (Ed. Gente, 2ª ed., 2007), assim como os capítulos 8 e 15 de O Ajuste Fino do Universo, de Alister McGrath (Coleção Ciência e Fé Cristã, Ed. Ultimato, 2017).

[5] Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica, Volume 2. Edições Loyola, 2005, p. 344,345 (Questão 74, Artigo 2º).

[6] John Wesley, Wesley’s Notes on the Bible. Disponível online em http://wesley.nnu.edu/john-wesley/john-wesleys-notes-on-the-bible. Acessado em 14/04/2019.

[7] John Wesley, A Survey of the Wisdom of God in the Creation: or, A Compendium of Natural Philosophy, 3ª ed. J. Fry, 1777, 2:463.

[8] Mark A. Noll e David N. Livingston (editores), B. B. Warfield: Evolution, Science, and Scripture. Baker, 2000, p. 14.

[9] Santo Agostinho, Comentário ao Gênesis. Coleção Patrística, Volume 21, 1ª edição. Paulus, 2005. p. 31 (Capítulo XIX, 37).

terça-feira, 9 de abril de 2019

"Interpretação Literal do Gênesis?" Revisitado e Comentado


Olá, leitores. Os que acompanharam os últimos textos aqui do blog sabem que passei a me posicionar mais fortemente a favor da teoria da evolução. Isto tem um impacto muito grande na história desse blog, já que o primeiro texto que postei aqui era justamente acerca da possibilidade de interpretação literal do Gênesis, e uma proposta de leitura a partir de uma posição que estaria mais alinhada com o criacionismo da Terra antiga. Este texto possui um certo valor sentimental para mim, por ser o artigo mais antigo do blog. Mas hoje, ele será revisado e comentado aqui.

sábado, 9 de março de 2019

O "Espectro criação-evolução": Quatro visões


Olá, leitores. Após o anúncio recente da minha mudança oficial de posição quanto à teoria da evolução, alguns leitores ficaram espantados. Teve até gente que veio me perguntar se eu perdi minha fé... calma, pessoal! Minha fé está tão ou mais forte do que antes. Alguns esclarecimentos maiores sobre o assunto virão em breve. 

Por ora, eu ainda preciso introduzir o assunto aqui no blog, pois falei muito pouco sobre a questão das origens em todos esses anos. Acho que isso foi de propósito. Nunca gostei de polarização em assuntos concernentes a fé, e sempre respeitei a visão de outras pessoas sobre o assunto. A minha própria visão foi meio indecisa por muito tempo.

sábado, 2 de março de 2019

Mudança no Blog


Olá, leitores. O que tenho a noticiar a vocês hoje é resultado de um processo que durou alguns anos. Provavelmente vai desagradar alguns, mas meu objetivo aqui nunca foi agradar a todos, e sim tão somente buscar e apontar para a verdade.

Coincidentemente, essa mudança acontece no aniversário de 8 anos deste mesmo blog. Comecei a escrever na época da faculdade. Interrompi por um ano a minha graduação para trabalhar como técnico em química, para me sustentar. Criei o blog para preencher um pouco do vazio que a distância da faculdade me deixou. Desde então o trabalho só foi crescendo, e eu junto. Hoje em dia posso dizer que amadureci muito em relação às minhas posições teológicas e cientificas. Já estou chegando ao fim do meu doutorado.

Ao longo dos anos fui ajustando muitas posturas e posicionamentos. O primeiro texto que publiquei aqui é na verdade de antes do blog. Era um questionamento sobre a interpretação literal dos primeiros capítulos do Livro de Gênesis. Esse talvez seja um dos assuntos que mais chamam a atenção de qualquer pessoa cristã que esteja começando a se aprofundar no estudo das ciências naturais. De fato, é um assunto pelo qual eu sempre me interessei. O posicionamento do texto era, na época, uma tentativa de conciliação entre o relato bíblico literal e dados científicos da história de nosso planeta. A posição que expressava na época tinha um pouco de concordismo, ou seja, de forçar a concordância entre a visão científica e a visão bíblica literal fazendo vista grossa às possíveis inconsistências que poderia ocorrer. Dentro do espectro criacionismo-evolucionismo, posso dizer que se encaixava dentro de um criacionismo da Terra antiga, ou seja, acreditando na visão cosmológica e geológica sobre a antiguidade da Terra mas sendo cético quanto ao relato biológico da origem das espécies, particularmente do homem.

Lembro-me de ter lido, mesmo antes disto, o livro A Linguagem de Deus, de Francis Colins. Talvez tenha sido o primeiro livro sobre ciência e fé cristã que eu li na vida. Na época, eu estava terminando o ensino médio e não tinha muita maturidade para absorvê-lo. O autor, um físico-químico e médico geneticista, ex-ateu e cristão, defendia abertamente a Evolução no livro. Minha primeira reação a isso foi talvez de escândalo - isto era impensável para mim - mas ao longo da leitura muito dos argumentos passavam a fazer algum sentido, e como ele era um especialista no assunto e eu não tinha competência alguma para contra-argumentar, decidi me calar sobre o assunto. A partir de então, eu não defenderia qualquer posicionamento sobre criação ou evolução, enquanto não pudesse estudar a fundo. Quando comecei o blog, eu pensava desta forma, e por isso, não fiz muitas afirmações categóricas a nível biológico naquele primeiro texto sobre o Gênesis.

Tive contato com muito materiais que defendiam o criacionismo literal (basicamente do Adauto Lourenço), inclusive fiz uma resenha do livro dele na época. Conheci depois a Teoria do Design Inteligente por conta do Marcos Eberlin e pelo blog do Luiz Francisco Pianowski. Não me aprofundei nesses assuntos na época por falta de tempo e, talvez, de interesse.

Eu sempre tive consciência, no entanto, que a evolução não era e nem podia ser um "problema" para a existência de Deus. É possível que Deus tenha criado as espécies através de um mecanismo evolutivo. Ainda me parecia difícil ver como isso poderia se conciliar com o texto de Gênesis, mas mesmo assim, deveria ser possível de alguma forma. O problema real é o de alguns cientistas adotarem a evolução como uma "filosofia", algo além de uma mera teoria científica, concluindo que o Universo é como é por uma série de acasos sem sentido algum por trás de tudo. Essa é a abordagem do biólogo e ateu militante Richard Dawkins, por exemplo. 

Enfim, sem mais delongas, creio que hoje em dia eu possa me expressar de maneira mais explícita e favorável à Teoria da Evolução das Espécies. Não parece haver nenhuma objeção séria à teoria atualmente do ponto de vista cientifico, assim como não parece haver nenhum problema de suas implicações na teologia cristã. Não vou contar muito acerca de como foi minha mudança nem argumentar a favor da evolução aqui. Isso deve vir nos posts seguintes.

Talvez vocês devam estar se perguntando: o que muda no blog a partir de agora? Bem, não muita coisa. Não pretendo fazer deste assunto o principal aqui. Postarei sobre Evolução quando sentir necessidade. Eu já não tenho postado tão frequentemente nos últimos anos. Estou pensando em aos poucos voltar a postar regularmente, mas não quero me comprometer ainda, pois pode ser que eu não consiga cumprir essa tarefa.

Por ora, alguns textos anteriores serão editados, possivelmente com notas explicativas acerca da minha mudança de posição. Espero publicar um comentário ao meu primeiro texto aqui, para deixar claras as minhas mudanças e meus posicionamentos atuais. Os próximos posts serão dedicados a mais algumas exposições e esclarecimentos.

Abraços, Paz de Cristo.

terça-feira, 1 de maio de 2018

[TRADUÇÃO] Deus como Designer - Buddy Spaulding

Olá, leitores. Trago desta vez um texto traduzido por um amigo meu da revista God and Nature, publicada pela American Scientific Association.  O texto dá algumas sobre o assunto Design Inteligente, sobre como associar a ideia de um designer ou planejador do Universo ao Deus cristão no qual cremos. Também há uma breve reflexão sobre a relação entre a evolução biológica e a questão d do design.  


Deus como Designer 

por Buddy Spaulding 

Qualquer pessoa familiarizada com o debate de décadas de duração sobre origens - ainda uma questão contenciosa no evangelicalismo americano - ouviu alguém dizer algo ao longo destas linhas: “Olhe para o olho humano! É tão complexo, só pode ser o produto do Design (divino)!”. Enquanto eu mesmo concordo que existe um design inerente ao mundo natural, e confesso plenamente que também concordo que o Designer é de fato Divino, a questão permanece: "o que se entende exatamente quando dizemos 'Designer'?" 

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

As 5 afirmações mais idiotas que ouvi na universidade



Se você quiser dar uma boa risada, basta visitar um campus universitário e ouvir em algumas conversas aleatórias. Os temas mais estranhos são discutidos. Vamos analisá-los. Muitas coisas idiotas são ouvidas nos campi universitários. A maioria vem da boca dos arrogantes estudantes de graduação que pensam que sabem tudo, mas não são os únicos… Às vezes os professores (em sua maioria) são piores! Especialmente quando se trata de religião, teologia e filosofia. Por que é que os professores que sabem pouco ou nada sobre religião, teologia, filosofia, política gostam de fazer afirmações ousadas sobre religião, teologia e filosofia e política? Eu ouvi o meu quinhão de acusações ridículas feitas em nome dos acadêmicos e eu decidi listar as 5 piores aqui.

5. O censo registrado em Lucas 2 é obviamente inventado. Por que César chamaria a todos para sua cidade natal, a fim de registrá-los? Imagine se Obama quisesse registrar a população e pedisse a todos para retornar à sua cidade natal! Imagine o caos que iria acontecer!

Of course! Porque nós sempre determinamos a historicidade de um evento na Antiguidade, imaginando como seria viável se fosse promulgado no século 21! Grande metodologia histórica!

O censo registrado em Lucas 2, que afirma que todos foram obrigados a voltar para sua cidade natal a fim de ser registrados não pode ser uma invenção só porque não conseguimos entender  como Obama emitiria uma ordem dessas atualmente. Usando essa linha de raciocínio, teríamos de jogar fora tudo o que sabemos sobre a história! Os faraós egípcios e imperadores romanos nunca deixaram de ver a si mesmos como figuras divinas, só porque o presidente Obama não proclama isso sobre si atualmente. Civilizações antigas não deixaram de utilizar carruagens como principal meio de transporte só porque a sociedade ocidental atual não utiliza normalmente carruagens, pois temos modos ligeiramente mais eficientes de transporte como automóveis e aviões (embora eu afirme que carruagens são muito mais legais).

4. Os Evangelhos foram escritos 200 anos após a morte de Jesus.

Eu ainda tenho que encontrar qualquer estudioso da Antiguidade que acredita nisso. Mesmo os estudiosos mais liberais e céticos do Novo Testamento colocam a composição dos Evangelhos dentro de todo o século I.

Marcos: 70 d.C.

Mateus: 80 d.C.

Lucas: 90 d.C.

João: 100 d.C.

Estas são datas gerais e estão mais próximas aos propostos por estudiosos liberais. A datação dos Evangelhos é complicada. Existem várias linhas de estudos acadêmicos que têm opiniões diferentes, mas os estudos mais acadêmicos e abalizados do Novo Testamento estão de acordo com relação aos Evangelhos terem sido compilados antes do século II.

3. O argumento cosmológico é muito frágil. Os defensores do argumento cosmológico não percebem que há um enorme problema com a ideia de uma “causa” para o universo. Eles não percebem que a causa tem que ser natural.

Então o sujeito simplesmente pára por aí, como se o caso fosse resolvido.

Você pode estar tão confuso quanto eu.

É isso mesmo? É isso o que está afirmando? Esse é o poderoso “argumento que põe por terra” o argumento cosmológico?

Se o universo tem uma causa, então a causa deve ser natural? Por quê? Além disso, se a natureza é definida como toda a matéria, energia, tempo e espaço, e se toda a natureza veio à existência no início do universo com o big bang, então como pode a causa de toda a natureza ser natural?

2. Não há nenhuma fonte não-bíblica que menciona Jesus.

Se por “nenhuma fonte” você quer dizer 33 fontes dentro de 150 anos de vida de Jesus, compostas por 20 fontes cristãs, 4 fontes gnósticas e 9 de fontes seculares, então você está correto!

Fontes seculares que mencionam Jesus: Josefo (historiador judeu), Tácito (historiador romano), Plínio o Jovem (político romano), Flegonte (escravo liberto que escrevia histórias), Luciano de Samósata (satírico grego), Celso (filósofo romano), Mara Bar Serapião (prisioneiro que aguardava execução), Suetônio (historiador romano), e Talo (Gary Habermas e Michael Licona,  Em defesa da ressurreição de Jesus, Grand Rapids: Kregel, 2004, p. 233).

1. Darwin contribuiu muito. Sabemos que Deus não existe, porque agora entendemos a evolução.

1. Darwin nos deu um mecanismo pelo qual podemos entender como as formas de vida mais elevadas evoluíram a partir de formas de vida inferiores.
2. Portanto, Deus não existe.

Ou há uma série de premissas implícitas que precisam ser retiradas para que esse argumento possa funcionar ou isso é logicamente falacioso (e muito tolo).

A conclusão não segue as premissas. É totalmente irracional. Como a evolução mostra que não há Deus? Não há absolutamente nenhuma conexão entre os dois. A evolução é simplesmente uma explicação para a variação e a similaridade entre e entre as espécies. Diz-nos como nós evoluímos. Ela não faz nada para apresentar um processo contra a existência de Deus. Nem um pouco.

Então temos isso, declarações tolas e imbecis feitas por aqueles que professam a honestidade intelectual e rigor na apresentação de pontos de vista opostos de forma justa e sem descaracterizações. Isto é essencialmente um disparate pseudo-intelectual que procura desacreditar o teísmo sem ter uma sólida compreensão dos argumentos e ideologias que estão sendo apresentadas. Deturpar a posição do seu adversário e argumentar contra ele sem tomar tempo para pesquisar corretamente, leva-se a objeções amadoras e argumentos facilmente refutáveis. Principalmente para os nossos  brilhantes faróis da academia …


Tradução: Emerson de Oliveira

segunda-feira, 12 de março de 2012

Mais uma sobre evolução: 15 questões aos evolucionstas

[NOTA DO AUTOR, 02/02/2019: anunciei aqui no blog que alguns dos meus posicionamentos científicos e teológicos mudaram. Por isso, este texto provavelmente não mais reflete minha opinião acerca do assunto.]

Lá vou eu de novo, postar mais um texto sobre evolução. Mas, antes que venham as pedradas, farei como sempre um breve aviso antes do texto principal. Eu não sou combatente de evolucionismo, nem muito menos sou defensor de um criacionismo interpretando o Gênesis literalmente (criação de 7 dias, etc.). Quem já leu meus textos anteriores sabe a minha opinião sobre o assunto. Portanto, o texto a seguir não é para atacar ninguém, apenas para fazer alguns questionamentos que eu não vejo serem respondidos pela teoria atual da origem e desenvolvimento da vida. Deveria haver um questionamento mais crítico a respeito disso, assim como muitos cientistas fizeram ao assinar o Dissent from Darwin. Ainda assim, eu ainda creio que há a possibilidade de algumas destas perguntas serem respondidas se a evolução tiver sido guiada por Criador inteligente.

Abraços, Paz de Cristo.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Evolução versus Naturalismo

Por que eles são como óleo e água

Por Alvin Plantinga

Tradução: Daniel Brisolara


Como todos sabem, tem havido uma recente enxurrada de livros atacando a fé cristã e a religião em geral. Alguns desses livros são um pouco mais do que ladainhas, cheios de insultos, mas curtos em razões, cheios de afrontas, mas curtos em competência, cheios de justas indignações, mas curtos em bom senso; na maior parte, eles são dirigidos mais por ódio do que pela lógica. É claro que existem outros que são intelectualmente mais respeitáveis – por exemplo, a contribuição de Walter Sinott-Armstrong em God? A Debate Between a Christian and an Atheist[1] [Deus? Um debate entre um cristão e um ateu] e a contribuição de Michael Tooley em Knowledge of God[2] [Conhecimento de Deus]. Quase todos esses livros foram escritos por filósofos naturalistas. Eu acredito que é extremamente importante ver que o naturalismo em si, a despeito do tom presunçoso e arrogante dos assim chamados Novos Ateus, está numa muito séria dificuldade filosófica: não se pode sensatamente acreditar nele.

Naturalismo é a idéia de que não há tal pessoa como Deus ou qualquer coisa como Deus; nós podemos pensar nessa posição como ateísmo turbinado ou talvez ateísmo plus. É possível ser ateu sem ascender a arrogantes altitudes (ou descender até as profundezas tenebrosas) do naturalismo. Aristóteles, os antigos Estóicos, e Hegel (ao menos em alguns estágios) poderiam apropriadamente ser considerados ateístas, mas eles não poderiam apropriadamente ser considerados naturalistas: cada um endossa alguma coisa (Primeiro Motor de Aristóteles, O Nous Estóico, O Absoluto de Hegel) que nenhum naturalista que se auto-respeite poderia tolerar.

Nos dias de hoje o naturalismo está excessivamente na moda na academia; alguns dizem que é a ortodoxia acadêmica contemporânea. Diante da moda de várias formas de anti-realismo e relativismo pós-moderno, isto pode ser um pouco forte. No entanto, o naturalismo é certamente mais difundido, e está exposto em alguns recentes livros populares como O Relojoeiro Cego de Richard Dawkins, A Perigosa Idéia de Darwin, de Daniel Dennett, e em muitos outros. Os naturalistas gostam de se agasalhar (ou de se envolver) nos mantos da ciência, como se a ciência de alguma maneira apoiasse, endossasse, subscrevesse, sugerisse, ou fosse de alguma maneira inabitual amigável ao naturalismo. Particularmente, eles freqüentemente recorrem à moderna teoria da evolução como uma razão para abraçar o naturalismo; de fato, o subtítulo do livro de Dawkins, O Relojoeiro Cego é Por que a Evidência da Evolução Revela um Universo sem Design. Muitos parecem pensar que a evolução é um dos pilares do templo do naturalismo (e “templo” é a palavra certa: o naturalismo contemporâneo tem, sem dúvida, assumido um invólucro religioso, com um sacerdócio secular fervoroso para reprimir visões opostas como qualquer mullah). Eu me proponho a argumentar que o naturalismo e a evolução estão em conflito um com o outro.

Eu disse que o naturalismo está numa dificuldade filosófica; isto é verdade em diversos aspectos, mas aqui eu quero me concentrar sobre apenas um – aquele conectado com a idéia de que a evolução apóia ou endossa ou é de algum modo evidência para o naturalismo. Do modo como eu vejo, isto é um erro colossal: evolução e naturalismo não são apenas companheiros constrangidos; eles são mais como combatentes beligerantes. Não se pode racionalmente aceitar ambos: evolução e naturalismo; não se pode ser um naturalista evolucionista. O problema, como muitos pensadores (C.S. Lewis, por exemplo) têm visto, é que o naturalismo, ou o naturalismo evolucionista, parece conduzir a um ceticismo fundo e penetrante. Ele leva à conclusão de que nossa cognição ou faculdades produtoras de crenças – memória, percepção, insight lógico, etc. – são duvidosas e não se pode confiar nelas para produzir uma preponderância de crenças verdadeiras sobre crenças falsas. O próprio Darwin teve preocupações com esses assuntos: “Comigo”, diz Darwin, “a dúvida horrível sempre surge se as convicções da mente do homem, as quais têm sido desenvolvidas da mente de animais inferiores, são de qualquer valor ou dignas de confiança. Poderia qualquer um confiar nas convicções da mente de um macaco, se houvesse qualquer convicção em tal mente?[3].

Claramente, esta dúvida surge para os naturalistas ou ateus, mas não para aqueles que acreditam em Deus. Isto porque se Deus nos criou à sua imagem, então mesmo que ele tenha nos moldado por meios evolucionários, ele presumivelmente queria que nós parecêssemos com ele na capacidade de conhecer; mas então a maior parte do que nós acreditamos pode ser verdade mesmo que nossas mentes tenham se desenvolvido a partir daquelas dos animais inferiores. Por outro lado, há um problema real aqui para o naturalista evolucionista. Richard Dawkins certa vez declarou que a evolução tornou possível ser um ateu intelectualmente realizado. Eu creio que ele está fatalmente enganado: eu não creio que é possível de alguma maneira ser um ateu intelectualmente realizado; mas de qualquer modo você não pode racionalmente aceitar ambos, evolução e naturalismo.

Por que não? Como segue o argumento?[4] A primeira coisa a se ver é que os naturalistas são também sempre ou quase sempre materialistas: eles pensam que os seres humanos são objetos materiais, com nenhuma alma imaterial ou espiritual, ou um eu (self). Nós somos apenas nossos corpos, ou talvez algumas partes dos nossos corpos, tais como o nosso sistema nervoso, ou cérebros, ou talvez parte de nossos cérebros (o hemisfério direito ou esquerdo, por exemplo) ou talvez alguma parte ainda menor. Então vamos pensar no naturalismo como incluindo o materialismo[5]. E agora vamos pensar sobre crenças de uma perspectiva materialista. De acordo com os materialistas, crenças, juntamente com o resto da vida mental, são causadas ou determinadas pela neurofisiologia, pelo que acontece no cérebro e no sistema nervoso. A neurofisiologia, além disso, também causa o comportamento. De acordo com a história habitual, sinais elétricos seguem via nervos aferentes dos órgãos sensoriais até o cérebro; lá alguns processos continuam; então impulsos elétricos vão via nervos eferentes do cérebro para outros órgãos incluindo músculos; em resposta a estes sinais, certos músculos se contraem, assim causando movimento e comportamento.

Agora, o que a evolução nos diz (supondo que nos diz a verdade) é que nosso comportamento (talvez mais exatamente o comportamento de nossos ancestrais) é adaptativo; desde que os membros de nossa espécie têm sobrevivido e se reproduzido, o comportamento de nossos ancestrais foi conduzido, no seu meio, à sobrevivência e à reprodução. Portanto, a neurofisiologia que causou este comportamento era também adaptativa; nós podemos sensatamente inferir que permanece adaptativa. O que a evolução nos diz, portanto, é que nosso tipo de neurofisiologia promove ou causa comportamento adaptativo, o tipo de comportamento que resulta em sobrevivência e reprodução.

Agora, esta mesma neurofisiologia, de acordo com o materialista, também causa crenças. Mas enquanto a evolução, a seleção natural premia o comportamento adaptativo (premia-o com sobrevivência e reprodução) e penaliza comportamentos mal-adaptativos, ele não se importa nem um pouco a respeito da crença verdadeira. Como Francis Crick, o co-descobridor do código genético, escreve no livro The Astonishing Hypothesis [A Hipótese Deslumbrante], “Nossos cérebros altamente desenvolvidos, conseqüentemente, não evoluíram sob a pressão da verdadeira descoberta científica, mas apenas nos possibilitam a ser sagazes o bastante para sobreviver e deixar descendentes”. Retomando este tema, a filósofa naturalista Patrícia Churchland declara que a coisa mais importante sobre o cérebro humano é que ele evoluiu; portanto, ela diz que a sua principal função é possibilitar ao organismo mover-se apropriadamente:
Resumindo o essencial, o sistema nervoso possibilita o organismo ter êxito nos quatro aspectos: alimentação, fuga, luta e reprodução. O cerne principal do sistema nervoso é colocar as partes do corpo onde elas deveriam estar a fim de que o organismo possa sobreviver… Melhoramentos no controle sensório-motor conferem uma vantagem evolucionária: um estilo imaginativo de representação é vantajoso na medida em que está engrenado no modo de vida do organismo e aumenta as suas chances de sobrevivência [ênfase de Churchland]. A verdade, o que quer que seja, definitivamente fica para trás[6].
O que ela quer dizer é que a seleção natural não se preocupa acerca da verdade ou da falsidade de suas crenças; preocupa-se apenas com o comportamento adaptativo. Suas crenças podem todas ser falsas, ridiculamente falsas; se seu comportamento é adaptativo você sobreviverá e reproduzirá. Considere um sapo sentado sobre uma vitória régia. Uma mosca o ignora; o sapo estende sua língua e a captura. Talvez a neurofisiologia que causa isto dessa maneira, também cause crenças. Até onde a sobrevivência e a reprodução sejam levadas em conta, isto não importará em absoluto o que essas crenças são: se a neurofisiologia adaptativa causa uma crença verdadeira (por exemplo, aquelas coisas pequenas e pretas são boas de comer), ótimo. Mas se causa uma crença falsa (por exemplo, se eu capturar a mosca correta, eu me transformarei em um príncipe), isto também está ótimo. De fato, a neurofisiologia em questão pode causar crenças que não tem nada a ver com as circunstancias presentes da criatura (como no caso de nossos sonhos); enquanto a neurofisiologia causar comportamento adaptativo, isto também está ótimo. Tudo que realmente importa, no que diz respeito à sobrevivência é à reprodução, é que a neurofisiologia cause o tipo certo de comportamento; se ela também causa crença verdadeira (em vez de crença falsa) é irrelevante.

Em seguida, para evitar chauvinismo entre espécies, não vamos pensar sobre nós mesmos, mas ao invés disso pensemos numa população hipotética de criaturas muito parecidas conosco, talvez vivendo num planeta distante. Como nós, essas criaturas desfrutam de percepção, memória, e razão; elas formam crenças sobre muitos assuntos, eles raciocinam e mudam de crenças, e assim por diante. Vamos supor, além disso, que a evolução naturalística vale para eles; isto é, suponha que eles vivam num universo naturalístico e tenham vindo à existência através dos processos postulados pela teoria evolucionista contemporânea. O que nós sabemos sobre essas criaturas, então, é que elas têm sobrevivido; a neurofisiologia delas tem produzido comportamento adaptativo. Mas e à respeito da verdade das crenças delas? E sobre a confiabilidade de suas produção de crenças ou faculdade cognitivas?

O que nós aprendemos de Crick e Churchland (e o que é em todo caso óbvio) é isto: o fato de que nossas criaturas hipotéticas terem sobrevivido não nos diz nada sobre a verdade de suas crenças ou sobre a confiabilidade de suas faculdades cognitivas. O que isto nos diz é que a neurofisiologia que produz essas crenças é adaptativa, assim como é o comportamento causado por aquela neurofisiologia. Mas simplesmente não importa se as crenças causadas também por aquela neurofisiologia são verdadeiras ou não. Se elas são verdadeiras, excelente; mas se elas são falsas, isto está bem também, desde que a neurofisiologia produza comportamento adaptativo.

Então considere qualquer crença particular da uma parte de uma dessas criaturas: qual é a probabilidade que esta seja verdade? Bem, o que nós sabemos é que a crença em questão foi produzida pela neurofisiologia adaptativa, neurofisiologia que produz comportamento adaptativo. Mas como nós temos visto, isto não nos dá nenhuma razão para pensar que essa crença seja verdadeira (e nenhuma para pensar que seja falsa). Nós devemos supor, portanto, que a crença em questão tem tanta probabilidade de ser falsa quanto de ser verdadeira; a probabilidade de qualquer crença particular ser verdadeira está perto de 1/2. Mas então é solidamente improvável que as faculdades cognitivas dessas criaturas produzam preponderantemente crenças verdadeiras sobre falsas conforme exigido pela confiabilidade. Se eu tenho 1.000 crenças independentes, por exemplo, e a probabilidade de qualquer crença particular ser verdadeira é 1/2, então a probabilidade de que 3/4 ou mais dessas crenças são verdadeiras (certamente uma exigência modesta o bastante para confiabilidade) será pouco menos do que 10(-58). E mesmo se eu estivesse trabalhando com um modesto sistema epistêmico de apenas 100 crenças, a probabilidade de que 3/4 delas sejam verdadeiras, dado que a probabilidade de qualquer um seja verdadeira é de 1/2, é muito baixa, alguma coisa como 0,000001[7]. Então as chances de que as crenças verdadeiras dessas criaturas substancialmente sobrepujem suas falsas crenças (mesmo numa área particular) são pequenas. A conclusão retirada é que é extremamente improvável que suas faculdades cognitivas sejam confiáveis.

Mas é claro que este mesmo argumento poderá também ser destinado a nós. Se o naturalismo evolucionista é verdadeiro, então a probabilidade de que nossas faculdades cognitivas sejam confiáveis é também muito baixa. E isto significa que alguém que aceite o naturalismo evolucionista tem um obstáculo para a crença de que as faculdades cognitivas dela são confiáveis: uma razão para desistir daquela crença, para rejeitá-la, para não mais sustentá-la. Se não existir um obstáculo para aquele obstáculo – um obstáculo-obstáculo, poderíamos dizer – ela não poderia racionalmente acreditar que as faculdades cognitivas dela são confiáveis. Sem dúvida que ela não poderia deixar de acreditar que elas são; sem dúvida ela de fato continuaria a acreditar nisso; mas a crença seria irracional. E se ela possui um obstáculo para a confiabilidade de suas faculdades cognitivas, ela também tem um obstáculo para qualquer crença que sejam produzidas por estas faculdades – as quais, é claro, são todas as suas crenças. Se ela não pode confiar nas suas faculdades cognitivas, ela tem uma razão, à respeito de cada uma de suas crenças, para desistir delas. Ela está, portanto, enredada num ceticismo profundo e abismal. Uma de suas crenças, contudo, é a sua crença no próprio naturalismo evolucionista; de modo que ela também tem um obstáculo para esta crença. O naturalismo evolucionista, portanto – a crença numa combinação de naturalismo e evolução – é auto-refutante, auto-destrutivo e atira no seu próprio pé. Portanto você não pode racionalmente aceita-lo. Por todos estes argumentos apresentados, ele pode ser verdadeiro; mas é irracional sustentá-lo. Assim o argumento não é um argumento para a falsidade do naturalismo evolucionista; ao invés disso, para a conclusão de que não se pode racionalmente acreditar naquela proposição. A evolução, portanto, longe de sustentar o naturalismo, é incompatível com ele, nesse sentido que você não pode racionalmente acreditar em ambos.

Que tipo de aceitação este argumento tem tido? Como você pode esperar, naturalistas tendem a ser menos do que inteiramente entusiastas acerca dele, e muitas objeções têm sido trazidas contra ele. Em minha opinião (a qual é claro algumas pessoas podem considerar tendenciosa), nenhuma dessas objeções é bem-sucedida[8]. Talvez a objeção mais importante e intuitiva seja como se segue. Retornando à população hipotética de alguns parágrafos atrás. Considerando, poderia ser que o comportamento deles fosse adaptativo mesmo que suas crenças fossem falsas; mas não seria muito mais provável que seus comportamentos fossem adaptativos se suas crenças fossem verdadeiras? E isto não significa que, desde que seus comportamentos são de fato adaptativos, suas crenças provavelmente verdadeiras e suas faculdades cognitivas provavelmente confiáveis?

Isto é na verdade uma objeção natural, particularmente dado o modo como nós pensamos sobre nossa própria vida mental. É claro que vocês são melhores candidatos a atingir seus objetivos, e é claro que vocês são melhores candidatos a sobreviver e a reproduzir se suas crenças são na sua maioria verdadeiras. Vocês são hominídeos pré-históricos vivendo sobre as planícies de Serengeti; claramente vocês não durarão muito se vocês acreditarem que os leões são gatinhos crescidos que gostam nada menos do que serem acariciados; Assim, se nós supomos que estas criaturas hipotéticas estão no mesmo tipo de situação cognitiva que nós ordinariamente pensamos que estamos, então certamente eles teriam muito mais provavelmente sobrevivido se suas faculdades cognitivas fossem confiáveis do que se elas não fossem.

Mas é claro que nós não podemos supor que eles estão na mesma situação cognitiva que nós pensamos que estamos. Por exemplo, nós supomos que nossas faculdades cognitivas são confiáveis. Nós não podemos sensatamente supor isto acerca dessa população; afinal de contas, o ponto principal do argumento é mostrar que se o naturalismo evolucionista é verdadeiro, então muito provavelmente nós e nossas faculdades cognitivas não são confiáveis. Assim refletindo uma vez mais sobre o que nós sabemos acerca dessas criaturas. Eles vivem num mundo no qual o naturalismo evolucionista é verdadeiro. Portanto, desde que eles tenham sobrevivido e reproduzido, os seus comportamentos têm sido adaptativos. Isto significa que a neurofisiologia que causa ou produz este comportamento tem também sido adaptativa: isto tem possibilitado a eles sobreviver e reproduzir. Mas e quanto às suas crenças? Estas crenças têm sido produzidas ou causadas pela neurofisiologia adaptativa; com certeza. Mas isto não nos dá nenhuma razão para supor estas crenças como verdadeiras. Até onde for a adaptatividade de seus comportamentos, não importa se tais crenças são verdadeiras ou falsas.

Suponha que a neurofisiologia adaptativa produza crenças verdadeiras: ótimo; ela também produz comportamento adaptativo, e que isto é o que importa para sobrevivência e reprodução. Suponha, por outro lado, que a neurofisiologia produza crenças falsas: novamente ótimo: ela produz falsas crenças, mas comportamento adaptativo. Realmente não importa que tipo de crenças a neurofisiologia produz; o que importa é o que causa o comportamento adaptativo; e isto ela claramente faz, não importa que tipo de crenças ela também produz. Portanto não há razão para pensar que se o comportamento deles é adaptativo, então é provável que suas faculdades cognitivas são confiáveis.

A conclusão óbvia, como assim me parece, é que o naturalismo evolucionista não pode sensatamente ser aceito. Os altos sacerdotes do naturalismo evolucionista proclamam em altas vozes que o cristianismo e mesmo a crença teísta está falida e que é ridícula. O fato, entretanto, é que a mesa virou. É o naturalismo evolucionista, e não a crença cristã, que não pode ser racionalmente aceito.



[1] Resenhado por Douglas Groothuis, em um texto onde quatro livros que lidam com o ateísmo de uma forma ou de outra são examinados [http://www.christianitytoday.com/bc/2008/004/12.39.html]. Nota do tradutor: O livro não possui tradução para o português.  

[2] Escrito em co-autoria com Alvin Plantinga na série Blackwell’s Great Debates in Philosoph (Blackwell, 2008). Nota do tradutor: O livro não possui tradução para o português.

[3] Carta a William Graham (Down, 3 de Julho, 1881), em The Life and Letters of Charles Darwin, ed. Francis Darwin (London: John Murray, 1887), Volume 1, pp. 315-16.

[4] Aqui eu vou fornecer apenas a essência do argumento; para uma descrição mais completa veja o meu Warranted Christian Belief (Oxford Univ. Press, 2000), cap. 7; ou minha contribuição para Knowledge of God (Blackwell, 2008); ou Natural Selection and the Problem of Evil (The Great Debate), editado por Paul Draper, www.infidels.org/library/modern/paul_draper/evil.html.

[5] Se você não pensa que o naturalismo inclui o materialismo, então pense no meu argumento como a conclusão de que não se pode sensatamente aceitar a conjunção tripartite do naturalismo, evolução e materialismo.

[6]Epistemology in the Age of Neuroscience,” Journal of Philosophy, Vol. 84 (October 1987), pp. 548-49.

[7] Agradeço a Paul Zwier, que realizou os cálculos.

[8] Veja, por exemplo, Naturalism Defeated?, ed. James Beilby (Cornell Univ. Press, 2002), que contém dez artigos por críticos do argumento, junto com minhas respostas às suas objeções.


Fonte: http://www.apologia.com.br/?p=116

Evolução darwiniana provaria a inexistência de Deus?


No meu último post, tratei um pouco sobre a forma como muitos ateus vêem o cientista Charles Darwin no quesito "contribuição científica". E terminei dizendo que iria falar mais um pouco sobre a relação entre evolução e a doutrina cristã. 

Os que me conhecem sabem que eu não gosto muito de falar sobre este tema. É algo que traz muita polêmica no âmbito de debate científico-religioso, e além disso eu não tenho conhecimento específico sobre o tema (faço faculdade de química, e não sou tão fã assim de biologia) e muito menos tenho uma opinião definida e convicta sobre o assunto (pessoalmente eu não acredito no criacionismo literal, pelos motivos que já citei aqui, mas também tenho minhas dúvidas sobre alguns absurdos da evolução naturalista). Por isso o objetivo deste post é apenas esclarecer o erro comum de que, independente de opiniões pessoais ou de posições oficiais de uma ou outra igreja, o evolucionismo em si não é incompatível com a crença em um Deus único, nem com o cristianismo bíblico.

Há alguns meses eu respondi uma pergunta no Yahoo! Respostas  que me gerou muita dor de cabeça. Um certo usuário me questionou por e-mail por causa da minha resposta (se você clicou no link, viu que a minha afirmação foi apenas que muitos Ph.D.'s em biologia estavam desacreditando da evolução darwinista e buscando outras alternativas). Ele me pediu pra eu provar isso, e eu provei mostrando o site Dissent from Darwin, que pra quem não conhece apresenta uma lista de vários cientistas, ateus ou teístas, desde físicos e engenheiros a biólogos e químicos que não vêem na evolução naturalista uma boa explicação, com evidências suficientes para o desenvolvimento da vida.

Enfim, pensei que ia acabar por aí, mas recebi uma chuva de e-mails, que fui respondendo com a maior paciência... ele pareceu pressupor que eu era algum tipo de militante criacionista ou defensor do design inteligente, e daí fez muitas acusações. Não contei o número total de e-mails, mas devem ter sidos uns trinta. No final eu desisti de discutir com ele exatamente porque não sei muito sobre evolução, até pedi a ele alguns artigos científicos que ele conhecesse sobre o assunto para eu ler também.

Agora, pouco mais de um mês depois do ocorrido, comecei a refletir sobre o assunto, tanto que escrevi o último post, e estava pensando: os ateus realmente vêem a evolução segundo Darwin como um ponto a favor deles. Mas será que funciona assim mesmo? A verdade é que, mesmo a evolução estando correta (eu ainda tenho minhas dúvidas), isso não representa perigo algum à fé cristã.

Abaixo eu transcrevo um trecho traduzido do debate entre William Craig e Christopher Hitchens onde Craig tem uma fala que cabe muito bem aqui, em resposta a Hitchens ter usado o sucesso da teoria da evolução como um argumento a favor do ateísmo:

"A teoria biológica da evolução é simplesmente irrelevante para o teísmo cristão. Gênesis 1 admite várias interpretações e não está comprometido de nenhuma forma com uma interpretação criacionista de 6 dias literais. Howard Van Till, Professor Emérito de Física e Astronomia em Calvin Coillege, escreve:  'O conceito de criação em 6 dias é requerido de quem acredita no Deus Criador descrito nas Escrituras? A maioria dos cristãos em minha área de estudos e que se engajaram em estudos bíblicos ou científicos concluíram que esta visão criacionista especial do mundo não é um componente necessário à fé cristã'.

E isso não é um passo atrás causado por descobertas científicas modernas. Santo Agostinho, em seu 'Comentário ao Gênesis', escrito no século IV,‎ explica que os dias não precisam ser interpretados literalmente, nem que a criação ocorreu há apenas alguns milhares de anos. Ele sugere que Deus criou o mundo em etapas que vão se desenrolando e desenvolvendo gradualmente ao longo do tempo. E essa interpretação apareceu 1500 anos antes de Darwin. Logo não é uma revisão da doutrina frente a descobertas modernas da ciência. 

Qualquer dúvida que eu possa ter quanto a teoria da evolução biológica é científica e não bíblica. A saber ela requer uma sequência fantasticamete improvável de eventos. Barrow e Tipler, dois físicos, no livro 'O Princípio Antrópico Cosmológico' listam 10 passos ao longo da evolução humana, cada um tão improvável que antes de acontecer  o Sol deixaria sua fase principal de estrela e incineraria a Terra! Por exemplo, eles calcularam que a probabilidade do genoma humano ter aparecido naturalmente é algo entre 4 eleveado a -180, elevado a 110.000 e 4 elevado a -360, elevado a 110.000!  Ou seja, se a evolução natural realmente ocorreu neste planeta foi literalmente um milagre! Logo uma evidência para a existência de Deus. 

Assim, eu não acho que seja um argumento para o ateísmo, muito pelo contrário, isto nos dá um bom suporte para afirmar que Deus atuou durante o processo evolutivo.

Os cristãos estão abertos às evidências para seguir para onde elas apontarem. Em contraste a isso, como afirmou Alvin Plantinga: 'Para os naturalistas a evolução é a única aposta  disponível, não importa o qual improvável as chances sejam contra ela... ela tem que ser verdade. Porque não há um projetista inteligente por trás dela. De certa forma temos um pesar pelos ateus, pois eles não podem realmente seguir as evidências para onde elas apontarem. Os pressupostos deles, o naturalismo, já determinam no que irão acreditar no fim. Por outro lado se exite um projetista e Criador do Universo , logo Ele pôde colocar, nas condições iniciais do Big Bang toda a sintonia necessária para permitir a evolução da vida inteligente.' Portanto eu penso que a evolução naturalista simplesmente não se sustenta frente à sua improbabilidade."

 A propósito, existe uma diferença entre evolução e naturalismo. A evolução enquanto teoria científica, descreve a origem das formas de vida existentes através dos processos naturais. Esta nada diz sobre a possível interferência de um Ser divino no processo, que poderia ser necessária, visto a cadeia de improbabilidades necessárias até chegar na complexidade humana de hoje em dia. Entretanto, o naturalismo é a crença de que não existe nada sobrenatural, pode ser entendida como uma forma de materialismo. Assim, hoje em dia o naturalismo é companheiro inseparável do darwinismo nos grandes círculos científicos. A evolução como vimos não representa perigo para a fé cristã, existe o evolucionismo teísta (recomendo a leitura do artigo do Wikipédia). É o naturalismo que, acrescido ao evolucionismo, se tornou um motivador da militância ateísta.

É claro que qualquer ateu terá muita dificuldade em aceitar a ideia de que um "ser imaginário" que sempre existiu simplesmente criou tudo que existe do nada. Entretanto não se apercebem que estão tão preocupados em rejeitar a ideia de Deus, que acabam não se importando em acreditar em algo mais absurdo: uma causa naturalista e aleatória para o Universo e a vida. Mesmo que seja inegável que o Universo e a vida existem, a probabilidade de terem surgido por causas naturais é simplesmente tão ridícula, que não faz sentido eles não acreditarem em Deus somente por defenderem que é improvável. Não estou querendo ser simplista aqui, é claro que eles também usam de outros argumentos, mas só pra concluir, à vista do que escrevi hoje, vejo esse argumento da improbabilidade como claramente inválido.

O próximo texto é  do renomado filósofo da religião Alvin Plantinga, e fala exatamente sobre essa relação entre evolucionismo e naturalismo que comecei a discutir no final da minha postagem.

Abraços, Paz de Cristo.

Referência

Fala de William Craig no debate contra Christopher Hitchens (vídeo):
http://www .youtube.com/watch?v=aJz63BESzrk

segunda-feira, 7 de março de 2011

Será que nós ganhamos na loteria cósmica?


Peguei esse texto de um site em inglês, e traduzi de próprio punho, por isso não estranhem se não consegurem entender algo. Se quiserem, procurem pelo artigo original em http://ultimatequestions.org/ que, aliás, também é uma ótima fonte de consulta, tendo todo o material disponível na língua inglesa.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Interpretação Literal do Gênesis? (parte 2)

[NOTA DO AUTOR, 02/02/2019: Oito anos após a publicação deste texto, anunciei aqui no blog que alguns dos meus posicionamentos científicos e teológicos mudaram. Por isso, este texto provavelmente não mais reflete minha opinião acerca do assunto.]

[NOTA DO AUTOR, 09/04/2019: Este texto foi revisado e comentado aqui.]

Como prometido, aqui está a segunda parte do texto, que contém mais apêndices e complementos ao primeiro. Boa leitura!


quarta-feira, 2 de março de 2011

Interpretação Literal do Gênesis? (parte 1)

[NOTA DO AUTOR, 02/02/2019: Oito anos após a publicação deste texto, anunciei aqui no blog que alguns dos meus posicionamentos científicos e teológicos mudaram. Por isso, este texto provavelmente não mais reflete minha opinião acerca do assunto.]

[NOTA DO AUTOR, 09/04/2019: Este texto foi revisado e comentado aqui.]

Esse é meu primeiro texto aqui, na verdade eu o redigi há vários meses, numa comunidade do orkut. Deixei ele guardado pois sabia que precisaria dele novamente. Hoje mesmo, respondendo a uma pergunta no Yahoo Respostas sobre o assunto, lembrei-me dele e senti vontade de compartilhá-lo com as pessoas.



Quero ressaltar que ele representa uma das visões possíveis do cristianismo sobre o assunto, não há uma visão absoluta, somos pessoas diferentes, pensamos diferente, mesmo assim essa diferença não nos faz cristãos melhores ou piores, essas questões são complementares e não fundamentais, a meu ver.



O texto defende com argumentos uma visão não literal do relato da criação no Livro do Gênesis. Não pretende ser uma explanação completa, apenas uma coleção de fatos que julgo serem interessantes. Está dividido em duas partes, para facilitar a leitura. Bem, vamos lá:



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