quinta-feira, 22 de agosto de 2013

O que seria das mulheres sem o cristianismo?


Por Leandro Teixeira.

Muito se fala sobre a situação da mulher na sociedade moderna. Acreditam não poucos que há um grande desnível – ou abismo mesmo – entre os direitos e deveres do homem e os da mulher, sendo que essa última tem sido historicamente prejudicada. E não faltam candidatos a carrasco do sexo feminino. A última moda agora é acusar as religiões de forma geral, e o Cristianismo, em especial.

Não há a menor dúvida de que existem religiões no mundo que cerceam os direitos da mulher. O Islamismo é um bom exemplo deste tipo. Tanto o seu livro sagrado como a sua literatura teológica discrimina e rebaixa gravemente a mulher a ponto de torná-la um objeto de propriedade, primeiramente do pai, e depois do marido. Contudo, neste texto quero provar que não há razão por que colocar o Cristianismo no mesmo cesto das religiões que pejoram a mulher. Mais do que isso, vou mostrar como o Cristianismo colocou a mulher em uma situação muito melhor do que qualquer outro sistema religioso ou filosófico que já existiu.

Um pouco de história

A vida da mulher não era fácil nas culturas antigas. Em geral, eram propriedade dos maridos. Não eram consideradas capazes ou competentes para agirem independentemente. Vejamos a Grécia antiga. Aristóteles disse que a mulher estava em algum lugar entre o homem livre e o escravo (considerando que a situação do escravo não era nenhum pouco auspiciosa, perceba a pobre situação feminina), e que era um “homem incompleto” (Política). Platão, por sua vez, entendia que se o homem vivesse covardemente, ele reencarnaria como mulher. E se essa se portasse de modo covarde, reencarnaria como pássaro (A República, Livro V).

A sorte das mulheres não era muito melhor na Roma antiga. Poucas famílias tinham mais de uma filha. O casamento romano era uma forma de trazer mais material humano para formação do exército, e assim permitir à Roma a continuidade de sua expansão; por isso, o interesse estava em ter filhos homens. Daquelas, porém, que sobreviveram ao infanticídio, eram-lhes reservadas as tarefas do lar, mas não o exercício da cidadania e a participação política, coisa reservada apenas aos patrícios homens.

Na China, até bem recentemente, o infanticídio era uma prática comum. Os bebês do sexo feminino eram entregues como alimento aos animais selvagens ou deixados para morrer nas torres dos bebês. Adam Smith escreveu sobre essa prática no seu famoso livro, A Riqueza das Nações, de 1776. Ele fala inclusive que o descarte de bebês indesejados era mesmo uma profissão reconhecida e que gerava renda para muitas pessoas.

Vejamos outros casos. Na Índia, viúvas eram mortas juntamente com seus maridos – a prática chamada de sati (que significa, a boa mulher). Também havia tanto o infanticídio quanto o aborto feminino. Além disso, meninas eram criadas para serem prostitutas cultuais – as devadasis. Nessa prática religiosa, a menina era “casada com” e “dedicada a” um dos deuses hindus. Nos rituais de adoração a esses deuses havia dança, música e outros rituais artísticos. Conforme iam crescendo, as devadasis se tornavam servas sexuais, de homens e dos “deuses”. Ainda hoje, famílias pobres entregam suas filhas para estas deidades com o objetivo de alcançar delas algum favor, ou ainda obter algum meio de renda com os frutos da prostituição.

Na África, o problema era semelhante à prática do sati da Índia. Quando um líder tribal morria, as esposas e concubinas do chefe eram mortas juntamente com ele. Mesmo hoje, no Oriente Médio, o valor da mulher é mínimo.

A mudança trazida pelo Cristianismo

Que diferença trouxe a vinda de Jesus Cristo entre nós? Muita, em vários pontos. Na verdade, foi uma revolução. Muito do que Jesus Cristo ensinou já era praticado pela sociedade judaica (que era muito diferente das nações à sua volta), e outros pontos tiveram seus termos desenvolvidos por Ele. Mas mesmo os judeus tinham um tratamento discriminatório em relação às mulheres; Jesus, entretanto, se relacionava de forma saudável com elas. De forma geral, o Cristianismo colocou a mulher em pé de igualdade com os homens. Como ele fez isso?

- Dizendo que ambos foram criados por Deus, à sua imagem e semelhança (E criou Deus o homem à sua imagem: à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou – Gên 1:27). Para Deus, homens e mulheres têm o mesmo valor (Gl 3.28);

- Que ambos deveriam dominar e sujeitar a natureza (E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra – Gn 1.28). Não há nada que impeça a mulher, tanto quanto o homem, de explorar a criação em cumprimento ao mandato cultural;

- A decisão de Deus criar a mulher a partir de Adão declara que ambos provêm da mesma essência (Gn 2.22), mostrando que a mulher em nada é inferior ao homem, nem tampouco lhe é superior. E a declaração de Adão mostra que sua mulher Eva é parte de si mesmo, tendo o mesmo valor que ele próprio (Gn 2.23 );

- Que o casamento, como instituição divina, implica que o homem foi feito para a mulher, assim como a mulher foi feita para o homem, e dessa forma ambos andam como uma unidade em dois corpos (Gn 2.24), o que destrói a ideia de que a mulher é escrava do marido, ou vice-versa. São complementares;

- O Cristianismo também evitou que a mulher fosse injustiçada, não permitindo a poligamia, que é inerentemente prejudicial a elas (1Co 7.2);

- O Cristianismo ensinou o cuidado com as viúvas. Elas, se não tivessem recursos, deveriam ser cuidadas e sustentadas pela igreja (1Tm 5). Se o marido morre, ela é livre para continuar viúva ou casar novamente, se quiser;

- O Cristianismo condenou a prostituição ao declarar que o corpo não pertence a nós mesmos, mas a Deus, e que ele é templo do Espírito Santo (1Co 6.13,19). O corpo do homem pertence à mulher, e o da mulher ao homem (1Co 7.4);

- O Cristianismo aprova a instituição do casamento, que não só protege a mulher da exposição aos males sociais, como provê um ambiente seguro material, espiritual e sentimentalmente para o seu desenvolvimento integral (Ef 5.28-29);

- O Cristianismo protege a vida, que entende começar no momento da concepção. Dessa maneira, nenhuma criança deixa de nascer devido a características indesejáveis (pelos pais) que ela tenha ou seja. A vida é direito inviolável, outorgada por Deus, sendo que somente Ele tem direito de reavê-la (1Sm2.6; Jó 1.21);

- O Cristianismo também proibe a pornografia, pois entende que ela é equivalente ao adultério. Com isto, a mulher deixa de ser vista como um objeto aos olhos do homem, e reserva o sexo e a nudez para aquele que tem direito a estas coisas, a saber, o marido (Mt 5.28).

Uma palavra sobre o movimento feminista

Se há algum direito, de qualquer pessoa que seja, que deva ser assegurado, eu sou completamente a favor da luta por ele. A sociedade falha em tratar as mulheres adequadamente porque ela não é uma sociedade moldada exclusivamente pela moral cristã. Muitos dos direitos pelos quais o movimento feminista luta são justos: direitos trabalhistas iguais aos do homem, proteção contra violência física e emocional, igualdade de direitos civis, entre outros. Porém, alguns pontos pelos quais ele luta não são bons, como, por exemplo, o aborto. Ora, o aborto sempre foi uma ferramenta usada pelo homem – e geralmente usado para evitar nascimento de mulheres! O aborto se refere a algo além do corpo da mulher; é outro ser vivo. Ocorre que ao lutar por este “direito”, a mulher trata um bebê ainda não nascido como algo menos que humano, tal como um objeto: ou seja, do mesmo modo que ela própria já foi tratada na história.

Outro problema que eu vejo é que algumas feministas mais exaltadas não querem simplesmente uma equiparação de direitos; desejam ocupar o lugar do homem que as explorava, transformando-se em exploradoras. Almejam uma inversão de papéis. Ao invés de uma sociedade patriarcal, sonham com uma matriarcal. E algumas feministas ainda descambam para a misandria – o ódio pelo sexo masculino.

Concluindo

O que o paganismo faz para proteger a mulher? Nunca fez nada, e nunca fará. E estas outras religiões não-cristãs? Normalmente colocam o sexo feminino em uma posição inferior a do homem. E o humanismo? Nada trouxe de bom para as mulheres. Na prática, uma vertente humanista (evolucionista) ensina que nada há de especial na humanidade; tudo que há é resultante de acaso. Somente o mais forte sobrevive (ou domina). Se for o sexo masculino, assim deve continuar a ser. É natural que seja assim. Não há justificativa moral (do ponto de vista evolucionista) para proibir a violência fisica, sexual, emocional à mulher, e nem mesmo porque condenar posicionamentos machistas. A máxima é “o que agora é, é o certo”.

Mas não é assim com o Cristianismo. Em todos os lugares onde ele chegou, as condições das mulheres melhoraram. Onde ele não alcançou, vê-se coisas terríveis, como a eugenia sexual, o infanticídio e a prostituição. Contudo, podemos ver que algumas sociedades, que já foram declaradamente cristãs, hoje estão decaindo moralmente com o avanço do antigo paganismo – legalizando o aborto, o homossexualismo e a prostituição. Seria interessante que algumas feministas, que falam ousadamente contra o Cristianismo, aprendessem um pouco mais da história da humanidade e assim apercebam-se de que, se não fosse por essa religião que elas tanto condenam, talvez elas sequer estivessem vivas hoje.

Fonte: Napec

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

A Falácia do Contexto Bíblico


A wiki Teonismo disponibiliza um grande acervo de material relacionado à apologética cristã. Recentemente vi lá algo que me chamou a atenção, e que é um problema recorrente nos debates entre o cristianismo e não-cristianismo (outras religiões ou o ateísmo). Trata-se da Falácia do Contexto Bíblico.

O nome foi criado pela própria wiki, como sendo uma falácia lógica não oficial, uma mistura da falácia do espantalho com a citação fora de contexto. Infelizmente, este é um dos métodos mais utilizados por neo-ateus para dar descrédito a certas verdades cristãs, alegando supostas contradições e incoerências bíblicas quando na verdade não se usa as ferramentas adequadas para o contexto bíblico.

A Falácia

O que normalmente ocorre é o fato de considerar-se alguns versículos da Bíblia sobre algum tema e ignorar-se os demais, acabando por causar incompreensões. Trata-se de uma mesclagem das falácias do espantalho (diminuir o valor real do argumento para tornar mais fácil de refutá-lo) e da citação fora do contexto (neste caso, todo o contexto bíblico).

Na minha visão, ocorrem dois problemas principais. O primeiro problema é ignorar o conceito cristão da complementaridade da Bíblia. O cristão lê a Bíblia como um documento único, não considerando trechos isolados dela como a palavra final para algo, sem considerar o que o resto da Bíblia diz sobre isso. Um exemplo disto é a Lei de Talião: "Olho por olho, dente por dente", enunciada em Êxodo 21.24. Dizer que a Bíblia é repulsiva porque apoia a vingança ou coisa do tipo, mas se olharmos a Bíblia como um todo, vemos que Jesus cerca de 1500 anos depois revogou essa lei, dando um entendimento mais perfeito aos homens: "Vocês ouviram o que foi dito: ‘Olho por olho e dente por dente’. Mas eu lhes digo: Não resistam ao perverso. Se alguém o ferir na face direita, ofereça-lhe também a outra. E se alguém quiser processá-lo e tirar-lhe a túnica, deixe que leve também a capa. Se alguém o forçar a caminhar com ele uma milha, vá com ele duas. Dê a quem lhe pede, e não volte as costas àquele que deseja pedir-lhe algo emprestado". (Mateus 5.38-42) Alguém aí poderá reclamar dizendo que isso é uma contradição da Bíblia, mas isso é desconsiderar o contexto em que estas duas coisas foram ditas. Voltarei a este assunto mais adiante.

O segundo problema, como eu já mencionei antes, é a falta de uso das ferramentas necessárias para a interpretação do texto bíblico. Assim como qualquer outro texto, a Bíblia está sujeita às regras básicas de interpretação de texto. E por se tratar de textos antigos, os procedimentos são mais criteriosos ainda em alguns aspectos.

Um panorama do texto bíblico

A Bíblia é um conjunto complexo de textos, escritos num período de cerca de 1400 a.C. a 90 d.C., por mais de 40 autores diferentes, com línguas diferentes (grego, hebraico e aramaico), e gêneros literários diferentes, que vão desde documentos oficiais de reis até poesias e hinos, passando por narrações, parábolas, epístolas, profecias, legislação e códigos morais. Não se lê uma poesia da mesma forma que se lê um relatório oficial, assim como não se lê uma narração histórica de um fato da mesma forma que uma parábola. Também não se pode analisar um texto escrito há milhares de anos utilizando o nosso pano de fundo cultural como guia. A mente das pessoas daquela época não é igual à nossa.

Além disso, muitas vezes não são esses detalhes históricos que são importantes para o cristão, mas sim a essência da mensagem bíblica, que consiste no relacionamento de Deus com o homem, centrado no ministério de Jesus Cristo quando veio à Terra. Todos os livros da Bíblia estão ligados direta ou indiretamente a este fato. Em Gênesis, vemos a raça humana sendo corrompida pelo pecado e Deus escolhendo uma um homem para formar a nação na qual um dia Jesus nasceria. Nos livros seguintes, Deus está preparando espiritualmente esta nação, aos poucos. No Novo Testamento a obra redentora de Deus para a humanidade é consumada e é contada a história dos primeiros seguidores de Jesus e das primeiras igrejas. Esta linha histórica deve ser clara na mente de quem deseja extrair informação pertinente do texto bíblico.

Ferramentas de interpretação

"A Hermenêutica é um ramo da filosofia que estuda a teoria da interpretação, que pode referir-se tanto à arte da interpretação, ou a teoria e treino de interpretação. A hermenêutica tradicional - que inclui hermenêutica Bíblica - se refere ao estudo da interpretação de textos escritos, especialmente nas áreas de literatura, religião e direito" (Wikipédia). Existe todo um conjunto de conhecimentos relacionados a como se deve interpretar um texto. A hermenêutica bíblica possui algumas regras:
Regra Fundamental (Primeira Regra):  Scriptura sacra sui ipsius interpres, isto é, a Escritura Sagrada é a sua própria intérprete. Muitas vezes o próprio texto bíblico explica o seu sentido. 
Segunda Regra: É necessário tomar as palavras no sentido que indica o conjunto da frase.
Terceira Regra: É necessário tomar a frase no sentido indicado no contexto, a saber, os versículos que precedem e seguem ao texto que se estuda.
Quarta Regra: É preciso tomar em consideração o objetivo ou desígnio do livro ou passagem em que ocorrem as palavras ou expressões obscuras.
Quinta Regra: É necessário consultar as passagens paralelas. Para conseguir a ideia completa e exata do que ensina a Escritura neste ou naquele texto determinado, talvez obscuro ou discutível, consultam-se não só as palavras paralelas, mas os ensinos, as narrativas e fatos contidos em textos ou passagens aclaratórios que se relacionem com o dito texto obscuro ou discutível. Tais textos ou passagens chamam-se paralelos de idéias.
Ás vezes, quando para a aclaração e correta interpretação de determinadas passagens que não são suficientes os paralelos de palavras e idéias, é preciso recorrer ao teor geral, ou seja, aos ensinos gerais das Escrituras.
É importante também estudar as figuras de linguagem ou de retórica (que aliás é tema obrigatório no ensino médio no Brasil), para entender quando os textos não são ditos literalmente. Isto é considerar a gramática na interpretação. Além disso, outro fator importante é o cenário histórico, ou seja, os eventos da narrativa, a quem é dirigida e como foi compreendida na época.

Voltando ao exemplo da Lei de Talião, se desconsiderarmos o contexto histórico da situação e olharmos para ela a partir dos dias de hoje, quando temos declarações de direitos humanos, etc.,  não vamos ver sentido naquelas palavras, e vamos supor que a Bíblia recomenda um padrão retrógrado de moralidade. Mas se olharmos esta passagem no sentido histórico e entendermos como alguém daquela época via este texto, perceberemos que ele se constituía em um grande avanço para a época. Deus estava ensinando a justiça para o seu povo, que estava acostumado a ser tratado injustamente por 400 anos, sendo escravizado no Egito, e desconheciam princípios básicos de justiça. A Lei de Moisés também continha o amor como um princípio complementar à justiça: "Não te vingarás nem guardarás ira contra os filhos do teu povo; mas amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o Senhor." (Levítico 19.18). Jesus veio e mostrou que na verdade o amor é superior à justiça, ou seja, completou o ensinamento de Moisés, revelou mais uma parte da verdade, fez mais um avanço para os dias da época, e de fato os padrões morais de Jesus são um avanço até para os dias de hoje, tendo em vista os ensinamentos como "amem os vossos inimigos e (...) orem por aqueles que vos perseguem" (Mateus 5.43).

Para complementar nossa visão, vamos falar um pouco mais de "amor". A frase bíblica "Deus é amor" (1 João 4.8) é muito conhecida. Aqui poderia se cometer o erro de pensar que Deus é "puro amor", que não existe nada mais em Deus além de amor romântico. Aliás há confusão até no conceito de amor aqui. O texto original em grego, usa a palavra agape, que é a tendência em se sacrificar para o benefício de outra pessoa, como os pais fazem com os filhos; não é o amor romântico ou sentimental. Além disso, o contexto mostra que João estava escrevendo uma carta para as igrejas cristãs do primeiro século d.C., e o assunto deste capítulo não era um "tratado sobre o amor de Deus", mas sim uma advertência contra os falsos ensinos que se proliferavam naquela época (v. 1), ressaltando que o amor (agape) era a marca do cristão verdadeiro (v. 7). Ampliando mais a nossa visão para abranger toda a Bíblia, descobriremos que o amor não é a única parte da essência de Deus, mas também há a santidade, justiça, fidelidade, graça, misericórdia, bondade, onipotência, onipresença, onisciência, etc. Uma vez que Deus é Santo, ele não tolera a corrupção e a maldade. Não se pode amar a verdade sem odiar a mentira; não se pode amar a pureza sem odiar a corrupção. Deus também odeia (Salmo 11:5).

As supostas contradições

Façamos um breve estudo de caso, quanto às desonestidades intelectuais proferidas por neo-ateus em desconsiderar o contexto bíblico. Um exemplo comum é o da apologia da Bíblia à escravidão. Veja a imagem abaixo:


Uma citação descontextualizada do apóstolo Paulo serve para afirmar que ele apoiava a escravidão, ou pior, afirmar que a Bíblia apoia a escravidão? Vamos lembrar dos elevados padrões morais bíblicos: o próprio Paulo disse uma vez que "nisto não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus" (Gálatas 3.28). Acho que vocês não tem noção do quanto esta frase é impactante para os padrões da época. Num contexto onde a exploração das mulheres e a escravidão eram regra, esta pérola moral surge dos ensinamentos de Paulo: todos são iguais perante Deus, o homem não é maior que a mulher, o senhor não é maior que o escravo. Ninguém na história havia dito isto antes, e de fato, este princípio moral é tão a frente de seu tempo que só foi absorvido pela cultura geral ocidental muitos séculos mais tarde com as declarações de direitos humanos. É isto que os textos paralelos nos esclarecem.

Olhando o contexto histórico, vemos que a escravidão praticada naquela época era em muito diferente da que estamos acostumados a pensar, da imagem a qual o cartaz nos remete enganosamente. Para isso basta ler um pouco de História. Além disso, a escravidão era uma realidade social existente há milhares de anos, que não poderia simplesmente ser mudada de uma hora para a outra, pois acarretaria em danos econômicos irreversíveis ao Império Romano, dentre outras coisas.  Por isso a solução pragmática de Paulo para aquele momento era procurar meios de tornar essa mesma realidade menos penosa para os escravos. Por isso recomendou um tratamento mais humano para os escravos e para que os mesmos fossem obedientes e comportados, evitando razões para serem castigados. O resultado histórico é que o padrão moral cristão aos poucos mudou esta realidade no Império Romano, fazendo com que muitos anos depois a escravidão fosse abolida naquela cultura. (Para saber mais sobre a Bíblia e a Escravidão, leia aqui no blog: A Bíblia e a Escravidão e Refutação # 13 - godisimaginary.com).

Por mais assustador que possa, parecer, existem sites neo-ateus especializados em cometer este tipo de falácia. O conhecidíssimo Why Won't God Heal Amputees? (Por que Deus não cura amputados?) é um belo exemplo disso, e o seu primo God is imaginary consegue ser ainda pior. Para quem não sabe, eu escrevi uma refutação completa deste último site, que você encontra aqui no blog: 50 "provas" que Deus é imaginário REFUTADAS.

Epílogo

Boa parte do conteúdo da Bíblia contém verdades de caráter espiritual, isto é, que visam atingir o nosso espírito, para aplicarmos em nosso relacionamento com Deus. Por isso a Bíblia deixa claro que é necessária a iluminação dada pelo Espírito Santo para a compreensão destas verdades no texto (1 Coríntios 2.10-16). Por isso o cristão acredita que não só a hermenêutica deve ser respeitada, mas também o relacionamento com Deus é importante para poder entender e aplicar as palavras espirituais como lições de vida. A atitude do cristão ao ler a Bíblia é a mesma que a oração do salmista: "Desvenda os meus olhos, para que eu contemple as maravilhas da tua lei" (Salmo 119:18).


Referências para estudo:

E. LUND - Hermenêutica: regras de interpretação bíblica. Disponível em:

Hermenêutica.com: princípios, estudos, mensagens e ilustrações

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Filósofo Luiz Felipe Pondé explica por que deixou de ser ateu


A revista Veja de 13/7 publicou entrevista interessante com o filósofo Luiz Felipe Pondé, de 52 anos. Responsável por uma coluna semanal na Folha de S. Paulo e autor de livros, Pondé costuma criticar certezas e lugares-comuns bem estabelecidos entre seus pares. Professor da Faap e da PUC, em São Paulo, o filósofo também é estudioso de teologia e considera o ateísmo filosoficamente raso, mas não é seguidor de nenhuma religião em particular. Pondé diz que “a esquerda é menos completa como ferramenta cultural para produzir uma visão de si mesma. A espiritualidade de esquerda é rasa. Aloca toda a responsabilidade do mal fora de você: o mal está na classe social, no capital, no estado, na elite. Isso infantiliza o ser humano. Ninguém sai de um jantar inteligente para se olhar no espelho e ver um demônio. Não: todos se veem como heróis que estão salvando o mundo por andar de bicicleta”. Sobre sexo, ele diz: “Eu considero a revolução sexual um dos maiores engodos da história recente. Criou uma dimensão de indústria, no sentido da quantidade, das relações sexuais – mas na maioria elas são muito ruins, porque as pessoas são complicadas.”

Leia aqui mais alguns trechos da entrevista:

Por que a política não pode ser redentora?

O cristianismo, que é uma religião hegemônica no Ocidente, fala do pecador, de sua busca e de seu conflito interior. É uma espiritualidade riquíssima, pouco conhecida por causa do estrago feito pelo secularismo extremado. Ao lado de sua vocação repressora institucional, o cristianismo reconhece que o homem é fraco, é frágil. As redenções políticas não têm isso. Esse é um aspecto do pensamento de esquerda que eu acho brega. Essa visão do homem sem responsabilidade moral. O mal está sempre na classe social, na relação econômica, na opressão do poder. Na visão medieval, é a graça de Deus que redime o mundo. É um conceito complexo e fugidio. Não se sabe se alguém é capaz de ganhar a graça por seus próprios méritos, ou se é Deus na sua perfeição que concede a graça. Em qualquer hipótese, a graça não depende de um movimento positivo de um grupo. Na redenção política, é sempre o coletivo, o grupo, que assume o papel de redentor. O grupo, como a história do século 20 nos mostrou, é sempre opressivo.

Em que o cristianismo é superior ao pensamento de esquerda?

Pegue a ideia de santidade. Ninguém, em nenhuma teologia da tradição cristã – nem da judaica ou islâmica –, pode dizer-se santo. Nunca. Isso na verdade vem desde Aristóteles: ninguém pode enunciar a própria virtude. A virtude de um homem é anunciada pelos outros homens. Na tradição católica – o protestantismo não tem santos –, o santo é sempre alguém que, o tempo todo, reconhece o mal em si mesmo. O clero da esquerda, ao contrário, é movido por um sentimento de pureza. Considera sempre o outro como o porco capitalista, o burguês. Ele próprio não. Ele está salvo, porque reclica lixo, porque vota no PT, ou em algum partido que se acha mais puro ainda, como o PSOL, até porque o PT já está meio melado. Não há contradição interior na moral esquerdista. As pessoas se autointitulam santas e ficam indignadas com o mal do outro.

Quando o cristianismo cruza o pensamento de esquerda, como no caso da Teologia da Libertação, a humildade se perde?

Sim. Eu vejo isso empiricamente em colegas da Teologia da Libertação. Eles se acham puros. Tecnicamente, a Teologia da Libertação é, por um lado, uma fiel herdeira da tradição cristã. Ela vem da crítica social que está nos profetas de Israel, no Antigo Testamento. Esses profetas falam mal do rei, mas em idealizar o povo. O cristianismo é descendente principalmente desse viés do judaísmo.

Também o cristianismo nasceu questionando a estrutura social. Até aqui, isso não me parece um erro teológico. Só que a Teologia da Libertação toma como ferramenta o marxismo, e isso sim é um erro. Um cristão que recorre a Marx, ou a Nietzsche – a quem admiro –, é como uma criança que entra na jaula do leão e faz bilu-bilu na cara dele. É natural que a Teologia da Libertação, no Brasil, tenha evoluído para Leonardo Boff, que já não tem nada de cristão. Boff evoluiu para um certo paganismo Nova Era – e já nem é marxista tampouco. A Teologia da Libertação é ruim de marketing. É como já se disse: enquanto a Teologia da Libertação fez a opção pelo pobre, o pobre fez a opção pelo pentecostalismo.

O senhor acredita em Deus?

Sim. Mas já fui ateu por muito tempo. Quando digo que acredito em Deus, é porque acho essa uma das hipóteses mais elegantes em relação, por exemplo, à origem do universo. Não é que eu rejeite o acaso ou a violência implícitos no darwinismo – pelo contrário. Mas considero que o conceito de Deus na tradição ocidental é, em termos filosóficos, muito sofisticado. Lembro-me sempre de algo que o escritor inglês Chesterton dizia: não há problema em não acreditar em Deus; o problema é que quem deixa de acreditar em Deus começa a acreditar em qualquer outra bobagem, seja na história, na ciência ou sem si mesmo, que é a coisa mais brega de todas. Só alguém muito alienado pode acreditar em si mesmo. Minha posição teológica não é óbvia e confunde muito as pessoas. Opero no debate público assumindo os riscos do niilista. Quase nunca lanço a hipótese de Deus no debate moral, filosófico ou político. Do ponto de vista político, a importância que vejo na religião é outra. Para mim, ela é uma fonte de hábitos morais, e historicamente oferece resistência à tendência do Estado moderno de querer fazer a cura das almas, como se dizia na Idade Média – querer se meter na vida moral das pessoas.

Por que o senhor deixou de ser ateu?

Comecei a achar o ateísmo aborrecido, do ponto de vista filosófico. A hipótese de Deus bíblico, na qual estamos ligados a um enredo e um drama morais muito maiores do que o átomo, me atraiu. Sou basicamente pessimista, cético, descrente, quase na fronteira da melancolia. Mas tenho sorte sem merecê-la. Percebo uma certa beleza, uma certa misericórdia no mundo, que não consigo deduzir a partir dos seres humanos, tampouco de mim mesmo. Tenho a clara sensação de que às vezes acontecem milagres. Só encontro isso na tradição teológica.

Fonte: CACP
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